Cirurgia
plástica íntima é mania mundial que preocupa ginecologistas
Lábios vaginais recauchutados e outros retoques
na genitália feminina não podem ser facilmente exibidos como peitões de
silicone ou barriguinhas lipoaspiradas. Mesmo assim, são o último fenômeno no
cardápio moderno das intervenções plásticas.Nos EUA, são feitas mais de 1,5 milhão de
cirurgias íntimas. No Reino Unido, 1,2 milhão.
No Brasil, médicos apontam um
crescimento de 50% nos últimos dois anos.
O ginecologista Paulo Guimarães é expert em
"design vaginal". Dá cursos de formação em cosmetoginecologia para
médicos. Nos treinamentos, diz, 900 mulheres são operadas por ano, a preços
menores. No consultório, "com atendimento personalizado e sigilo",
afirma fazer 15 cirurgias íntimas por mês.
O cirurgião plástico Marcelo Wulkan, que atende em
São Paulo e tem trabalhos sobre redução de lábios vaginais em publicações
internacionais, diz fazer cem desses procedimentos por ano.
Mesmo médicos mais conhecidos por outros tipos de
cirurgia, como implantes mamários e plástica de nariz, estão vendo a procura
crescer.
"Nos últimos dois anos, passei de uma cirurgia
íntima para três por mês", conta Eduardo Lintz, chefe de cirurgia plástica
do hospital HCor, de São Paulo, e professor do Instituto Ivo Pitangui, no Rio.
No total, Lintz faz cerca de 40 cirurgias plásticas mensais.
Tamanho-Padrão
Como não há evidências de que os lábios vaginais
cresceram nos últimos anos, especula-se que o aumento de cirurgias redutoras
esteja ligado à uma nova busca de medidas genitais "padrão".
E o que é uma vagina normal? Assim como as
estatísticas brasileiras sobre cirurgia íntima, as medidas são imprecisas.
"Isso é um pouco subjetivo. Quando o lábio menor não ultrapassa 2 cm de
largura pode ser considerado normal", diz Wulkan.
Está longe de ser consenso. Segundo estudo no
"British Journal of Obstetrics and Gynaecology", a diversidade de
tamanhos observada nos lábios vaginais da população é imensa, o que amplia o
espectro de normalidade.
O mesmo estudo aponta que trabalhos anteriores
definiram como acima do normal lábios com mais de 4 cm de largura, mas essa
medida deve ser revista e ampliada.
Quando os lábios menores ultrapassam os maiores, a
tendência é serem considerados candidatos à cirurgia. Mas não se trata de uma
imperfeição física.
"É constitucional, a mulher nasce com essa
característica, como nasce com um nariz grande", diz Lintz.
No entanto, o que é natural já não é o normal.
Imagens de nus femininos, reportagens e material
didático criam o modelo de normalidade, diz a antropóloga Thais Machado-Borges,
do Instituto de Estudos Latino-Americanos da Universidade de Estocolmo, Suécia.
No estudo "Um olhar antropológico sobre a
mídia, cirurgia íntima e normalidade", ela diz que as mulheres consideram
atrativas as formas que correspondam a esse modelo, criadas por técnicas
cirúrgicas. "Será que essas cirurgias podem transformar zonas erógenas em
'paisagens' onde reina o prazer?", questiona.
Como em relação a narizes, peitos e bundas, o
padrão estético muda conforme a época e o país. "Nos EUA, as mulheres
querem vagina pequena, cor-de-rosa. As brasileiras querem no mesmo tom de pele
do das mãos, com lábios de 1 cm a 1,5 cm", diz o ginecologista Paulo
Guimarães.
"É o modelo imaginário do órgão de menininha,
o formato 'sou virgem'", interpreta a psicóloga Rachel Moreno.
A Federação Brasileira das Associações de
Ginecologia e Obstetrícia alerta seus membros sobre riscos dessa onda.
"É preciso muito cuidado para mexer em locais
com tantas terminações nervosas. As cirurgias íntimas são vendidas como soluções
para dificuldades sexuais, mas, se você mexer onde não era para mexer, você
piora o que era para melhorar", diz Gerson Lopes, presidente da comissão
de sexologia da entidade.
Por Iara Biderman em:
Um dos painéis que
compõem o "Grande Mural da Vagin", do artista plástico inglês Jamie
McCartney
Riscos da
cirurgia íntima incluem redução da sensibilidade
Para chegar à suposta vagina perfeita, a mulher
passa 50 minutos em posição ginecológica (deitada com as pernas abertas e
flexionadas), enquanto o médico corta e costura suas partes íntimas.
É considerada uma cirurgia de baixa complexidade.
Os principais riscos, segundo os médicos, são
sangramentos e infecções, principalmente se algum ponto abrir. "Como a
região é muito manipulada na hora da higienização, há sempre o perigo de algum
ponto se soltar", diz o cirurgião plástico Marcelo Wulkan.
Em casos raros, pode haver fibrose, segundo o
ginecologista Gerson Lopes, da Febrasgo (federação das sociedades de
ginecologia).
Zona Sensível
E a pergunta que não quer calar: há perda de
sensibilidade nessa zona erógena do corpo feminino?
"Querendo ou não, você está tirando áreas
sensíveis, cheias de terminações nervosas e vasinhos. Alguma coisa vai
perder", diz Lopes.
Dói? "Nos primeiros dias, a sensação é que
queima", diz o cirurgião plástico Carlos Komatsu, diretor da Sociedade
Brasileira de Cirurgia Plástica. Logo após a cirurgia, a região incha e pode
ficar roxa.
Sexo? Só depois de 30 dias, pelo menos. É o mesmo
período para se abster de atividades físicas muito intensas ou andar de
bicicleta.
Passada a abstinência, dizem os médicos, a mulher
está liberada para desfrutar dos benefícios da cirurgia, como ficar mais à
vontade durante a relação sexual e na academia de ginástica, o que teria como
consequência a melhora de sua autoconfiança.
"Mulheres com lábios muito grandes têm
vergonha de mostrar o corpo e sentem desconforto ao usar roupas justas",
diz o cirurgião plástico Romeu Fadul, do Hospital Sírio-Libanês, de São Paulo.
Por Iara Biderman em:
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